Tomada de decisão pela perspectiva da neurociência e psicologia: Parte 2

Tomada de decisão pela perspectiva da neurociência e psicologia: Parte 2

Com felicidade, esse é o segundo texto que complementa o tema sobre Tomada de decisão pela perspectiva da neurociência e psicologia. No primeiro conteúdo, discutimos sobre o que é a tomada de decisão, estruturas envolvidas no processo de decisão, discutimos também sobre sobrecarga de informação, benefícios prometidos, aversão à perda e benefícios entregues. Para a compreensão do conteúdo de hoje, é super importante a leitura do primeiro que você pode ter acesso neste link.

Jogo das decisões

Aprofundando um pouco mais no assunto, é preciso compreender o “Jogo das decisões”. Essa é uma forma didática, apresentada pelo professor André Palmini, de mostrar o que acontece em um processo decisório. É instigante a analogia do conceito, pois remete à ideia de competição.

Este jogo possui três tempos, um primeiro, um intermediário e um segundo tempo. O jogo começa quando um estímulo ou uma vontade aparece, designado como primeiro tempo. Esse estímulo gera uma resposta que está situada no segundo tempo do jogo.

Uma vez tomada a decisão é gerada uma consequência, boa ou ruim, imediata ou a longo prazo.

Entre o estímulo e a resposta existe o tempo intermediário, onde há ponderação sobre como responder ao estímulo. Nessa ponderação, destaca-se algumas funções executivas do cérebro:

  • Inibição de impulso: É o controle de impulso, se o indivíduo não tiver a inibição de um impulso, ele pode responder de uma forma inadequada para a situação.
  • Memória operacional: É a capacidade de se trazer para o plano consciente as memórias relevantes para aquela decisão, podemos atribuir à repertório.
  • Sintetizar cenários futuros: É a capacidade de sintetizar o que pode acontecer no futuro a partir de diferentes caminhos que podem ser tomados.

Para apoiar o usuário nesse processo, pode-se, no momento de síntese de cenários futuros, repassar os cenários, comunicar com ele o que vai acontecer caso continue usando um produto ou serviço. Aqui é possível aplicar mais uma vez o conceito de aversão à perda: se o cliente parar de usar um produto ou serviço o que vai acontecer? Se ele não tomar essa decisão, qual será a consequência? etc.

Ao projetar experiências é muito comum ser repassado aos clientes diversos dados, indicadores, números, mas poucas informações, não fala-se diretamente com o usuário o que vai acontecer se ele tomar ou não uma decisão. Por exemplo, um aplicativo para incentivar os clientes a investirem e pouparem dinheiro informa para seus clientes o valor das suas carteiras, quanto estão economizando e gráficos das suas economias, é bem provável que esses dados não ajudem uma pessoa a investir ou poupar de forma inteligente, porque ele não entrega o caminho que o usuário precisa fazer para poupar ou investir mais, ele simplesmente entrega os dados e espera que o cliente trilhe sozinho o caminho das pedras. Nós, como empresas ou profissionais, que somos especialistas em um determinado assunto, temos que indicar o melhor caminho pro nosso cliente e não só fornecer os dados pra ele.

A resposta final que o cliente vai tomar, sua decisão final, dependerá do conjunto de experiências que ele possui, mas pode-se induzir o processo, como identificou-se ao longo deste texto. Até o momento foi falado de um processo decisório estruturado e complexo, principalmente se analisarmos a nível cerebral, mas no dia a dia, não são destrinchadas todas essas análises. É como se os indivíduos tivessem um GPS EMOCIONAL, cujo sistema ajuda na economia de energia de processos decisórios.

GPS Emocional

O GPS Emocional, é responsável por posicionar um estímulo dentro do contexto de tomada de decisão no campo emocional, avaliando quanto a decisão vai ser boa ou quanto gerará frustrações. Esse processo acontece sem uma avaliação consciente das consequências da decisão.

Entretanto, ao pensar nesse GPS emocional, que ajuda a economizar energia e praticamente inibe a reflexão na tomada decisão, deve-se lembrar que as ações são estimuladas pelas recompensas, o que está relacionado ao sistema dopaminérgico. Essas estruturas cerebrais que fazem as pessoas correrem atrás de recompensas foram desenvolvidas há milhões de anos, sendo mais potentes e difíceis de alterar.

Em contato com estímulos externos ou sensações corporais, o cérebro reproduz desejos que motivam o indivíduo a tomar uma decisão para satisfazer o desejo projetado. Estamos sempre em busca de prazer, principalmente na forma inconsciente.

Para posicionar a reflexão de uma decisão neste GPS emocional, será resgatado uma série de experiências e crenças que marcaram emocionalmente aquele indivíduo.

Marcadores Somáticos

Para entender como as experiências são marcadas emocionalmente, é necessário entender o que são Marcadores Somáticos, conceito criado e publicado por Antônio Damásio em 1994 em seu livro “O Erro de Descartes, Emoção, Razão e Cérebro humano”.

“Os marcadores somáticos são marcas cerebrais da alegria, tristeza, do medo e da excitação” — André Palmini.

Marcador ‘somático’ porque a origem é uma emoção básica sentida ‘no corpo’ — mas ‘armazenada no cérebro’.

Para simplificar, o marcador somático é um mecanismo automático que suporta as nossas decisões. Emoções básicas como alegria, tristeza, medo e excitação marcam nossas experiências, essas marcas ficam armazenadas em redes neurais distribuídas no cérebro humano e situações semelhantes ao longo da vida evocam não apenas a memória do fato como a marca emocional associada.

Seu produto é digno de um marcador somático de alegria ou excitação?

Tendo isso em vista, reforça-se novamente a importância de deixar evidente para seu usuário os benefícios e realizações na perspectiva emocional que ele terá ao utilizar seu produto. Pela relevância das nossas experiências emocionais, é de extrema importância a comunicação do seu produto ser humana, sensível e expositiva para conseguir criar conexão entre o cliente e sua empresa.

Livre-arbítrio e potencial de prontidão

Diante das informações fornecidas, pode-se concluir que o ser humano não desfruta de um livre-arbítrio, tanto livre, muitas das suas decisões não são racionais e conscientes. Um conceito abordado pela neurociência que traz uma perspectiva sobre esse tema é o Potencial de Prontidão.

Antes do indivíduo ter a motivação de realizar uma ação, até 10 segundos antes de ter consciência que quer fazer algo ou de executar a ação em si, seu cérebro já se preparou para realizar tal ação.

Esse conceito foi validado experimentalmente para atos motores, ainda existem questionamentos se isso ocorre para além deles.

No dia a dia do seu usuário existe algum comportamento ou ação que ele faz sem ter consciência que possa ser utilizada como uma adição ou reaproveitamento para estimular o uso do seu produto ou serviço?

Com certeza, existe um grande universo ainda a ser explorado sobre tomada de decisão, mas acredito que já temos bastante conhecimento que podemos nos ancorar para construir produtos mais leves e assertivos para nossos usuários. Além das conexões e formas de aplicar os conhecimentos que foram descritos no texto, se você visualizou mais alguma conexão ou formas diferentes de aplicação, compartilhe em comentários ;)

Para lembrar :) É super importante ressaltar que todo conceito e perspectiva deve ser adaptado e aplicado experimentalmente, então teste e avalie o impacto desses conhecimentos no seu produto e claro, compartilhe comigo como foi…Cases com esse tipo de conhecimento aplicado são muito benéficos para a comunidade de produto e design.

Quer saber mais sobre a Behavioral Product Lab, clique no link: https://bityli.com/AAeG4N

Obrigada pela leitura :)